[.] Raimundo Quintas
Há três anos que Raimundo Quintas trabalha na livraria « Dinis », situada a duas casas da esquina. A livraria « Dinis » assemelha-se muito à vida de Raimundo, de tal forma que este sentiu-se melhor ali que em qualquer outro sítio onde já tivesse trabalhado. Velha e privada de sol (ao contrário da loja da esquina, bela e calorosa), assim se espelhava o ambiente nas faces pálidas do homem (em oposição à florista, de faces coradas e brilhantes).
Antes de arranjar o emprego como livreiro, Raimundo andara a empacotar tubos de pasta de dentes numa fábrica de dentífricos, recebendo abaixo do salário mínimo. Até ser despedido, não era feliz. O barulho das máquinas ensurdecia-o a cada segundo que ali passava. Conseguia ver os seus neurónios, um por um, a abrandar, a morrer, a sucumbir. À noite tinha zumbidos que nem a almofada conseguia abafar.
Agora Raimundo, na paz e na escuridão, sente-se reconfortado. Nos tempos livres colecciona rótulos de garrafas de água, a única que bebida que aprecia. Compra vários tipos de água e sabe distingui-las de olhos fechados. Nunca deixou de achar que a da marca « Caramulo » era a melhor de todas. Às terças, deita-se no sofá a ver televisão, com o som no mínimo. Todos os dias, lê livros de Georges Simenon e Lobsang Rampa. Antes de deixar o dia, fuma o seu cigarro habitual na pequena varanda de metal enferrujado da sala.
Raimundo amou uma vez, Isabel, ou Belinha, aos 16 anos. Belinha casou em França, soube ele por uma carta, e nunca mais a viu. Não tem família ou amigos próximos. Raimundo cresceu com a tia Julieta, a velha que mora nos subúrbios, e com o seu gato, Matias. Raimundo sempre gostou mais de Matias do que dela. Depois de Belinha, nunca mais se apaixonou ou se importou minimamente com o seu aspecto. Tem um pente de dentes partidos e olhos vidrados, cor de avelã. Adormece frequentemente em cima das almofadas tricotadas pela avó Amélia que nunca conheceu, tem um candeeiro e pó. Raimundo é daqueles que se afastou do mundo por opção. Nunca olha para ninguém nos olhos.
(Se Raimundo não fosse Raimundo, e Maria não fosse Maria, teriam tempo de partilharem as suas fobias e a sua consequente arte de viver.)
Apesar de parecer um vagabundo, Raimundo não é mais que homem de 33 anos que colecciona rótulos de garrafas de água…
One face among the many, I never thought you cared.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
• in today's news
• o lar é onde o coração está
- x Alsace.
- x Barneville-Carteret.
- x Colmar.
- x Fort Boyard.
- x Freiburg.
- x Gent.
- x La Roche Sur Yon.
- x La Rochelle.
- x Jard-Sur-Mer.
- x La Tranche-Sur-Mer.
- x Les Sables D'Olonne.
- x Longeville-Sur-Mer.
- x Luçon.
- x Lyon.
- x Marseille.
- x Mont Saint Michel.
- x Nantes.
- x Paris.
- x Poitiers.
- x Saint Vincent Sur Jard.
- x Rennes.
- x Soustons.
- x Talmont Saint Hilaire.
- x Alandroal.
- x Alcácer do Sal.
- x Alcoutim.
- x Alvito.
- x Beja.
- x Estremoz.
- x Moura.
- x Castro Verde.
- x Grândola.
- x Évora.
- x Evoramonte.
- x Mértola.
- x Portel.
- x Reguengos de Monsaraz.
- x Serpa.
- x Rendondo.
- x Viana do Alentejo.
- x Vidigueira.
- x Vila Viçosa.
Sem comentários:
Enviar um comentário